Povo do Ar – Holly Black ?>

Povo do Ar – Holly Black

Jude Duarte luta para sobreviver todos os dias. Ela e suas irmãs foram adotadas pelo general feérico Madoc depois que este matou seus pais humanos. Na Terra das Fadas, humanos não são amados, mas Madoc faz questão de que suas filhas sejam bem-tratadas e recebam a mesma educação das outras crianças nobres. Mas os imortais são criaturas perversas, e os mortais que se esquecem disso não sobrevivem aos jogos.

Jude não quer nada mais que pertencer àquele mundo. O mundo de beleza eterna, de vida crepuscular, de criaturas mágicas que superam a limitada imaginação humana. Ela fará o que for preciso para ser aceita pelos imortais – nem que ela tenha que se tornar tão ruim quanto eles.


Eu estava com muito medo, quando comecei Povo do Ar, de não gostar. Porque sabemos que eu e livro hypado não nos damos bem. Mas eu já li Holly Black antes e me lembrei de ter gostado. Então decidi dar uma chance honesta pra série (e eu ia ficar muito chateada se eu não gostasse de mais uma série que meu namorado me dá de presente). E, olha só, eu entendo o hype. Mas acho que o booktok está completamente errado em relação a esse livro.

Eu li o original em inglês, como com a primeira série da autora, The Modern Faerie Tales [Contos de fadas modernos], que recebeu uma repaginada da editora e está sendo publicada em edições lindas, ainda que eu não possa falar da tradução. Mas a escrita dela deu uma boa evoluída de uma série para a outra. Ficou mais concisa e se adaptou bem aos tempos. A primeira série é bem anos 2000 (não que eu me lembre muito, eu era uma xóvem criança), mas Povo do Ar é um exemplo de como a fantasia mudou ao longo desses poucos anos. A escrita da autora está mais forte, impactante, e tudo é friamente calculado. Há muito poucas pontas soltas na história, e acho que, no todo, é uma das melhores fantasias que saiu nos últimos tempos. Mas sinto que muito disso acaba sendo ocultado pelo grande problema revolvendo essa trilogia.

Eu acho difícil falar dos personagens de Povo do Ar sem falar de romance. E não posso falar do romance sem falar do problema dessa série. É muito simples. Tudo o que você ouve de Povo do Ar nas redes sociais é o romance, como o romance é incrível, como o romance é maravilhoso, e tudo o mais.

Surpresa: Povo do Ar não é um romance.

Não como os livros de Corte, da Sarah J. Maas, que são um romance em um mundo fantástico. A trilogia é uma fantasia com um romance enemies to lovers [inimigos a amantes] interessante, mas que não é o foco da narrativa. Tanto a editora quanto os leitores gostam de focar nisso, mas esses livros não são um romance. Tanto o Cardan quanto a Jude são insensíveis e calculistas. E eles vão fazer o que for necessário para os planos deles funcionarem, mesmo que eles tenham que passar um por cima do outro. Então a maior parte do relacionamento desses dois é só eles sendo terríveis um com o outro. E é muito difícil pro fandom aceitar isso, como quando eu falei no Skoob que a Jude mandar o Cardan se prostituir não era romântico e veio gente discutir comigo. Prender esses livros no gênero do romance é um desserviço para eles, e quase propaganda enganosa.

Eu adoro personagens frios, calculistas e inteligentes, então adorei acompanhar Jude e Cardan enquanto eles sabotavam um ao outro, ainda que ambos quisessem mais ou menos a mesma coisa. Muitos outros personagens aí são assim também, à la mundo das fadas. Mas uma opinião que eu não largo é que a Taryn é uma chata e eu fiquei torcendo pra ela eventualmente morrer a série inteira, a Vivi é uma egoísta ridícula, e eu não fui com a cara do Locke desde o começo. Acho que todos os personagens de Povo do Ar são sólidos e bem construídos, e gostei muito de ver a complexidade da Jude e do Cardan, mas esses três previamente mencionados me deram ódio do começo ao fim. E, claro, o aparecimento de alguns personagens de The Modern Faerie Tales é um easter egg sempre bem vindo, ainda que eu teria aproveitado mais se eu tivesse lido as trilogias mais próximo uma da outra (li The Modern Faerie Tales em 2020, apelidei o livro de “minha leitura de férias”. Sabem, naquela época em que a gente ainda achava que ia ficar em casa por duas semaninhas e ia poder relaxar?).

Neste ponto, já entendemos que chamar Povo do Ar de romance é reducionista porque a história é muito mais do que isso, correto? Agora, deixa eu te falar, fazia muito tempo que eu não lia uma fantasia com plot twists tão chocantes e imprevisíveis. Juro, eu criei 1001 teorias, fiz um monte de comentário no Skoob, só pra ver todas elas serem destruídas. Isso me deixou extremamente satisfeita. É uma trilogia muito política, assim como Crônicas de Gelo e Fogo (claro, não é no mesmo nível de complexidade, mas é muita politicagem). Na verdade, o fenômeno de tentar transformar isso num romance é similar ao que aconteceu com outra trilogia super política, A Guerra da Papoula (que eu ainda não li, mas tenho vontade).

É difícil eleger um favorito entre os três livros, O Príncipe CruelO Rei Perverso, e Rainha do Nada, mas acho que gostei mais do primeiro. A história é a que mais me agradou, todos sendo apresentados para o mundo (ainda que eu tenha passado muita raiva com as irmãs da Jude). O segundo foi o que eu achei o mais fraco, porque eu não gosto de ver uma personagem previamente estabelecida como super poderosa e manipuladora só levando porrada e se ferrando e fazendo decisões erradas. Rainha do Nada, então, é meu segundo colocado nesse pódio, porque expandiu o mundo mas, ao mesmo tempo, teve uma resolução importante (que não posso falar do que porque é spoiler) um pouco óbvia.

Povo do Ar tem uma trama sólida, fechada, e que vai te deixar extremamente satisfeito como leitor de boa fantasia. Uma escrita evoluída e que sabe o que deve fazer para te envolver e personagens cativantes que representam muito o que buscamos na literatura são peças cruciais no jogo de Holly Black, que criou uma trilogia que merece entrar para os clássicos da nossa geração.

Se você gostou de Povo do Ar, de Holly Black, você vai gostar de:

The Modern Faerie Tales – Holly Black;

The Spanish Love Deception – Elena Armas;

Corte de Espinhos e Rosas – Sarah J. Maas.

Extra: se você gosta de animes, te recomendo Mahōtsukai no Yome, ou The Ancient Magus’ Bride, que está disponível no Crunchyroll.

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