
Bloodchild: finalmente gostei da Octavia E. Butler
Vamos aproveitar que Bloodchild é uma novela pequena demais para eu conseguir fazer uma resenha normal, então vou aproveitar para escrever sobre os livros da Octavia E. Butler que eu nunca cheguei a resenhar porque… bem… vamos lá.
Bloodchild
Bloodchild me pegou completamente de surpresa. A novela estava gratuita na Amazon há milhares de anos e só cheguei a ler em 2024. O que eu achei que seria uma leiturinha de avião pra matar o tempo e diminuir a TBR do Kindle se tornou minha primeira experiência realmente positiva com a Butler. Gostei tanto da novela (li o original em inglês, mas a Morro Branco lançou uma edição que tem até mais textos) que ela entrou pro meu top 10 de 2024 em 6º lugar.
Dentro dessa história, uma colônia de humanos saídos da Terra convive com os Tlic, a espécie alienígena que domina o planeta em que vivem. Os Tlic descobrem que humanos são ótimas chocadeiras para seus ovos, então as espécies fazem um trato de ajuda mútua: a colônia humana pode se estabelecer no planeta, mas uma criança de cada família deve gerar os ovos dos Tlic. O personagem principal de Bloodchild, Gan, questiona o futuro sangrento e subserviente que o espera se a Tlic T’Gatoi implantar seus ovos dentro dele. O leitor testemunha a rebeldia de Gan contra este ato considerado comum e venerado no planeta sem saber, até o último instante, se sua crise existencial o libertará de um destino não consentido.
Em poucas páginas, Butler consegue criar uma sociedade alienígena complexa e explorar como nos relacionaríamos com seres fora do nosso planeta. A discussão sobre direitos reprodutivos é uma que vejo muito pouco e que foi feita de maneira muito eficaz ao colocar um protagonista homem (assim como os filmes de Alien são uma metáfora pro estupro, não?). A novela tem um texto forte e poderoso, que te dá um soco na cara a todo momento. O final é maravilhoso e só aumenta a complexidade da discussão do texto, que mereceu todos os prêmios que ganhou – o Hugo, o Locus e o Nebula são os mais importantes para a ficção científica. Percebi a falta dessa rica construção de mundo nos outros textos que li da autora, que parecem estar a anos-luz de distância de Bloodchild.
Kindred
Todos concordamos que eu preciso parar de ler livros hypados pelo meu bem, né? Não achei Kindred, provavelmente o livro mais famoso da autora, ruim, mas também não achei nada de mais. Talvez devamos considerar o agravante que, na época, eu o li como parte de uma leitura coletiva – dando mais uma chance para esse tipo de coisa. Como esperado, odiei a experiência da LC e Kindred foi um de apenas dois livros que li com o grupo (que deveria ler doze livros ao longo do ano).
Em Kindred conhecemos Dana, uma estadunidense negra que se muda para um novo apartamento com seu marido e lá acaba caindo em um portal e volta no tempo para a Maryland do século XIX, onde a escravidão segue forte. Sem conseguir voltar para a (relativa) segurança do século XXI, Dana sente na pele os horrores sofridos por seus antepassados. Suas ações naquele passado não tão distante, ela precisa se lembrar, podem impactar a sua própria existência.
Não estou dizendo que Kindred não é um livro importante, mas eu já havia estudado muito sobre escravidão, principalmente nos EUA, para me chocar com o que estava ali. Não consegui sentir empatia por nenhum personagem (viva a neurodivergência) e, de acordo com minhas anotações da época, nem a tradução me agradou. O livro será muito importante para quem quer aprender mais sobre escravidão e acho que ele é ótimo para ser trabalhado em escolas, mas na minha vida e para o meu conhecimento, não fez diferença nenhuma.
A parábola do semeador
Li A parábola do semeador para uma matéria do primeiro ano da faculdade, e juro que não sei nem o que dizer sobre o livro – a falta de anotações no meu Skoob chega a ser cômica.
Nesta ficção especulativa em que os EUA estão se desfazendo sob catástrofes climáticas e desigualdade social (o que, sinceramente, são só os dias de hoje), Lauren Olamina nasce com a capacidade de sentir o que as pessoas sentem. Basta olhar para alguém e ela sente seus sentimentos, mas principalmente a dor – o que não é ideal em um futuro distópico violento. Quando Lauren cresce, ela acaba saindo pelos Estados Unidos seguida por um grupo, com quem cria a religião de Earthseed, pregando que é através do esforço humano que Deus é criado e a mudança ocorre. Tudo em busca de um lugar seguro no fim do mundo.
E é isso. Eu não me lembro de mais nada sobre A parábola do semeador. Sei que o livro não fedeu nem cheirou para mim, porque dei 3 estrelas no Skoob (assim como Kindred) mas não fiz nenhum comentário. A trama demora de fato para acontecer e fiquei um tempão presa nas primeiras 100 páginas – me forcei muito para continuar. O mundo não é nada de interessante, é só mais uma versão dos EUA distópicos. Este foi o livro que solidificou na minha cabeça que a Butler não é a autora para mim (eu nem sou fã de ficção científica!), mas depois de Bloodchild penso que poderia gostar mais dos textos curtos dela.
Se você gostou de Bloodchild, de Octavia E. Butler, você vai gostar de:
Dormir em um mar de estrelas – Christopher Paolini;
O guia definitivo do mochileiro das galáxias – Douglas Adams.