Dragões de Éter – Raphael Draccon ?>

Dragões de Éter – Raphael Draccon

O mundo de Nova Ether é cheio de magia. A rainha de Arzallum, o reino dos reinos, é uma fada amazona, casada com um Rei que liderou uma grande caça às bruxas. Anões moram nas montanhas, dragões moram em lagos, elfos moram em ilhas. E, além disso, crianças sofrem ataques de usuários de magia maus.

Os jovens João e Maria Hanson, quando crianças, foram enganados por uma bruxa. Eles comeram lama, vidro, terra e madeira, achando que eram os doces mais gostosos do mundo. Os irmãos ficaram presos na casa da bruxa canibal, que se preparava para comê-los. Eles escaparam, mas o trauma permaneceu. Mais ou menos na mesma época, a jovem Ariane Narin, a caminho da casa da avó, é atacada por um lobo. Um caçador salvou a menina, mas a avó não teve a mesma sorte.

Anos depois, bruxas e piratas começam a sair de seus esconderijos e rondam Arzallum. Há um plano maligno em andamento, e os irmãos Hanson e a jovem Narin vão estar no meio de tudo.


Se Dragões de Éter é o livro da sua vida, que fez você se apaixonar pela leitura, não leia essa resenha. Porque, se Maximum Ride foi a grande decepção literária de 2019, a série de Draccon ganha o título em 2021.

As novas edições da editora Melhoramentos foram o que me fizeram finalmente ler a série. As capas são lindas, e esse é o meu primeiro box. Eu lembro que, quando Círculos de chuva lançou, eu ganhei o livro (sim, me deram o terceiro livro de uma série de presente, considerando que eu não tinha os outros). Eu fiquei um pouco assustada na época, porque o livro era bem grosso e tinha uma capa muito série, e acabei doando. Essas edições fazem bem mais sentido para o público-alvo do livro. Mas gente, quanto erro de digitação! Muitos! Coisas horrendas, que não sei como que passaram pelos olhos de um revisor (teve um?).

Raphael Draccon se tornou meu escritor brasileiro homem favorito com Legado Ranger. Depois de Dragões de Éter, o pódio está ameaçado. Antes de toda a reclamação, tenho que dar crédito: a escrita dele é bem fluída e ótima para quem quer começar a ler livros maiores. Os capítulos são curtos. Mas é isso. Eu nunca odiei tanto um narrador na minha vida. A quantidade de masculinidade tóxica é IMPOSSÍVEL de ler sem querer se rasgar no meio. O narrador se recusa a descrever os personagens masculinos, e só faz isso com alguns deles “pela audiência feminina”. Eu não sabia a aparência dos irmãos Branford até o quarto livro.

Muitos comentários são INADIMISSÍVEIS no dia de hoje (não vou nem falar de todas as referências a abuso animal que ele faz), e vou colocar um trecho que me incomodou particularmente aqui para ilustrar:

O que a maioria das meninas na pré-adolescência, na adolescência, na juventude, e também na fase adulta, e, hoje em dia, até mesmo na velhice, pensa? Em meninos, ou rapazes, ou homens, ou senhores de respeito e com boa índole, ora essa! Algumas, até nos sem isso…

Eu tinha que me lembrar que Draccon escreveu esses livros adolescente, quando não sabia de muita coisa sobre o mundo (disse a guria de 18 anos), e que devemos separar narrador de escritor, mas ele refletiu tanto da vida dele nesses livros que foi impossível. Como eu sei bastante da vida do Draccon (eu acompanho bastante as entrevistas dele), eu entendi CADA UMA das referências à vida dele. Isso não é algo que me agrada de modo geral (e é por isso, por exemplo, que não gosto dos livros mais antigos do King). Dragões de Éter me traumatizou tanto que fiquei com medo de reler Legado Ranger, com medo de que a série também seja ruim e que, na época que li, gostei porque eu não conhecia melhor.

Eu fico sempre de olho em livros que adaptam contos de fadas, por causa dos personagens. Há tantas possibilidades de retrabalhá-los! Mas a sensação que tive lendo Dragões de Éter é que TODOS os personagens estão lá APENAS para fazer João Hanson (no qual o Draccon se espelha) e Axel Branford (no qual Draccon se espelha). As mulheres, principalmente. Ariane foi uma grande decepção, porque toda a narrativa dela gira em torno do romance com o João. Até a questão da bruxaria. A Maria, pelo menos, vira professora. Mas tudo gira em torno do Axel. Isso é muito cansativo, até porque eu não acho nenhum dos dois nada de mais. Todos os títulos, todas as conquistas, são deles. Os outros personagens “principais” mal podem ser considerados isso. A narrativa de Liriel Gabbiani e Snail Galford é ridícula, inútil para a história. O que é muito triste pra mim, porque adoro uma história de pirata. Mas temos capítulos que acompanham os dois a série inteira, e eles não fazem diferença nenhuma para a história principal. Os primeiros três livros, por sinal, excluem completamente a existência de pessoas LGBTQ+. O 4º livro tenta resolver todos os erros dos três primeiros livros, o que não deu muito certo. Temos 3 personagens LGBTQ+ na história. Um casal de homens gays (que só estão lá pra ensinar o João sobre ser gays e até o conflito deles com um homofóbico quem resolve é o hétero) e Emile, que eu até agora não entendi se é trans ou não (Emile diz se ver como menino, mas só se é referido à personagem no pronome feminino, até quando o narrador acompanha o ponto de vista delx). Sinceramente, entre esse tipo de representação e nenhuma, eu preferia nenhuma.

Em questão de história, Dragões de Éter podia ter funcionado muito melhor se tivesse sido escrito em contos. Porque não tem uma trama muito pronunciada. Você se interessa pelo resto da série para saber o que acontece com os personagens (mas já saiba que Axel e João conseguem tudo). Em todos os livros, a sinopse diz que o problema do livro vai “mudar o mundo”. E não muda nada. Cada livro tem uma trama própria, mas nenhuma delas é muito interessante. Corações de neve, o segundo livro, por exemplo, é um livro só sobre um torneio de boxe de, talvez, uma semana. Os capítulos são tão espalhados que, talvez, contos tornassem os nós soltos mais suportáveis. Ele funcionaria melhor até como uma série.

Eu entendo que Dragões de Éter seja uma série importante para a literatura brasileira, tanto em âmbito nacional quanto mundial. Eu sei que esses livros são importantes para muita gente, que cresceram com eles. Mas, pensando em questão de literatura, existem livros melhor escritos, tramas mais fortes, adaptações de contos de fadas melhores. A escrita fluída do Draccon ajuda novos leitores a entrar no gênero, mas a gramática oral (ele escreve como se fala) pode incomodar leitores mais experientes. Em resumo, uma série ruim para leitores com o mínimo de experiência, mas tem seu valor para jovens leitores da faixa dos 10 anos.

Se você gostou de Dragões de Éter, de Raphael Draccon, você vai gostar de:

The Witcher – Andrzej Sapkowski;

Terra de histórias – Chris Colfer;

The Priory of the Orange Tree – Samantha Shannon.

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