Alice – Melhores Poemas ?>

Alice – Melhores Poemas

Poemas são algo presente em Alice. É sério, é uma quantidade absurda. Eu estava marcando as páginas com poemas pra eu transcrever (com pedacinhos de papel) e deram 25. E tem páginas que têm mais de um poema, só que pequenininhos. Mesmo assim, só vou colocar os meus dois poemas preferidos, o Pargarávio e o A Morsa e o Carpinteiro.

Pargarávio

Solumbrava, e os lubriciosos touvos
Em vertigiros persondavam as verdentes;
Trisciturnos calavam-se os gaiolouvos
E os porverdidos estriguilavam fientes.

“Cuidado, ó filho, com o Pargarávio Prisco!
Os dentes que mordem, as garras que fincam!
Evita o pássaro Júbaro e foge qual corisco
Do frumioso Capturandam.”

O moço pegou da sua espada vorpeira:
Por delongado tempo o feragonista buscou.
Repousou então à sombra da tuntumeira,
E em lúmbrios reflaneios mergulhou.

Assim, em turbulosos pensamentos quedava
Quando o Pargarávio, os olhos a raisluscar,
Veio flamiscupindo por entre a mata brava.
E borbulhava ao chegar!

Um, dois! Um dois! E inteira, até o punho,
A espada vorpeira foi por fim cravada!
Deixou-o lá morto e, em seu rocim catunho,
Tornou galorfante à morada.

“Mataste então o Pargarávio? Bravo!
Te estreito no peito, meu Resplendoroso!
Ó gloriandei! Hosana! Estás salvo!”
E na sua alegria ele riu, puro gozo.
Solumbrava, e os lubriciosos touvos
Em vertigiros persondavam as verdentes;
Trisciturnos calavam-se os gaiolouvos
E os porverdidos estriguilavam fientes.

Alice, páginas 124-125.

Não adianta procurar algumas palavras no dicionário. Elas (como porverdidos) são junções de duas ou mais palavras. Lembremos que Alice foi escrito, originalmente, em inglês. Imagine esse negócio em inglês. Nessa versão da Zahar, tem não só o poema original, como uma tradução para o francês e uma pro alemão (nota da minha vida: alemão já é uma junção de palavras imensa. Esses dias eu tive que decorar a palavra die Geschwindigkeitsbeschränkung. Sabe o que isso significa? Placa de trânsito. Aquelas pra indicar limite de velocidade. 28 LETRAS PRA ISSO). Voltando pro assunto, eu até poderia transcrever os outros poemas, mas vocês vão ter que comprar a edição pra saber. Até porque esse post já tá atrasado e demora muito pra transcrever esses poemas.

Bem, eu tenho um desafio: vocês vão identificar as palavras estranhas nesse poema e comentar suas suposições sobre o que sejam. Eu sei algumas e dá pra ter uma vaga ideia de pelo menos uma palavra quando você lê. Vou ajudar um pouquinho:

PORVERDIDOS = PORcos VERdes perDIDOS. Sim, é nesse nível.

E o segundo poema:

A Morsa e o Carpinteiro.

O sol brilhava sobre o mar,
Com raios certeiros, pujantes,
Aplicava sua melhor arte
A tornar as ondas coruscantes.
E isso era estranho porque
Batera meia-noite pouco antes.

A lua brilhava mofina,
Porque pensava que o sol,
Depois de o dia termina,
Devia se retirar.
“É muita indelicadeza”, dizia,
“Vir aqui me ofuscar.”

O mar estava molhado; mas não devia estar.
A areia estava seca a não poder mais secar.
Nuvem, não se via uma só, porque
Não havia nenhuma no céu a flutuar.
Nenhum pássaro cortava os ares…
Pois não havia pássaros a voar.

A Morsa e o Carpinteiro
Caminhavam lado a lado.
Choravam copiosamente ao ver
O chão assim, tão de areia forrado:
“Se ao menos fizessem uma faxina,” diziam,
“Isso poderia ficar em bom estado!”

“Se sete criadas com sete esfregões
Por um ano isto aqui esfregassem,
Acha possível”, a Morsa perguntou,
“Que toda essa areia limpassem?”
“Duvido”, disse o Carpinteiro
E uma lágrima sentida derramou.

“Ó Ostras, venham fazer um passeio!”
Disse a Morsa suplicante.
“Uma boa conversa, um belo recreio,
Pelas praias verdejantes:
Mas apenas quatro em cada volteio
Para as mãos lhes dar adiante.”

A Ostra mais velha o relanceou
Mas a boca não disse palavra.
Deu apenas uma piscadela,
E a pesada cabeça meneou…
A sugerir: “Deixar a ostreira
Para flanar? Ai, isso não vou.”

Quatro ostrinhas, porém, acorreram,
Muito sôfregas pelo regalo:
Vestidinho limpo, rosto lavado,
Sapatos nos trinques e rabo de cavalo,
E isso era estranho, se bem pesado,
Porque tinham o coco rapado.

Quatro outras ostras as seguiram
E depois mais, de par em par.
Por fim aos bandos chegaram,
E foi um não mais acabar.
Todas saltando na espuma das ondas,
E voltando à praia a bracejar.

A Morsa e o Carpinteiro
Andaram um bom estirão.
Depois descansaram numa pedra
Jeitosa que havia no chão.
Então as ostrinhas todas
Puseram-se em fila, de prontidão.

“É chagada a hora”, disse a Morsa,
“De falar muitas coisas:
De sapatos… e barcos… e vazas…
De repolhos… e reis… e lousas…
E porque o mar tanto ferve
E se os porcos têm asas.”

“Só um minutinho”, as Ostras gritaram,
“Antes da nossa conversa;
Estamos tão esbaforidas,
Viemos em tal correria!”
“Temos tempo!” disse o Carpinteiro,
Rindo, num gesto de galhardia.

“Um naco de pão”, a Morsa disse,
“É o que vem a calhar;
Depois pimenta e vinagre
Não são de se dispensar…
Já estão prontas, Ostrinhas queridas?
Vamos dar início ao jantar.”

“Mas não vão nos jantar!” as Ostras gritaram,
Perdendo um pouquinho a cor.
“Após tanta gentileza,
Oh, é tão desolador!”
“É uma bela noite”, disse a Morsa,
“Apreciam esta beleza?”

“Foram tão gentis conosco!
Não criaram um só embaraço!”
O Carpinteiro disse apenas:
“Corte-me mais um pedaço!
Minha fome é tamanha
Que todo esse pão hoje eu traço.”

“É uma vergonha”, a Morsa disse,
“Lhes fazer uma falseta dessa,
Depois que os trouxemos tão longe
E as fizemos andar tão depressa!”
O Carpinteiro disse só:
“Vamos à primeira remessa!”

“Choro por vocês”, a Morsa disse.
“Tenho o coração contristado.”
E entre soluços e lágrimas, foi
Puxando as graúdas p’ro seu lado.
Depois, levou o lenço aos olhos,
Que ainda estavam marejados.

“Ó Ostras”, disse o Carpinteiro.
“Fizeram uma boa corrida!
Que tal correr de volta pra casa?”
Mas nenhuma resposta foi ouvida…
E não era de se estranhar, porque
Ostra por ostra tinha sido comida.

Alice, páginas 150-154.

Depois que você lê esse poema você percebe como os personagens são psicopatas. Muito psicopatas, atraindo as vítimas para a morte certa. Pra mim eles parecem mais estupradores, se aproveitando da inocência das pobres ostras. O pior é que, no sétimo verso, uma ostra mais velha vê as ostrinhas e percebe o que vai acontecer, mas apenas ignora. Pelo menos o poema ensina a não acreditar em uma morsa e um carpinteiro.

Eu acho que nunca disse isso antes, mas talvez já tenham percebido: post novo toda quarta-feira.

Eu sei.

Hoje é sexta.

Dois dias atrasados.

Às vezes eu atraso demais.

Desculpa.

3 Comentários

  1. Gostaria de saber que edição é esta. Você pode postar as referências, editora essas coisas?
    Obrigada 😉

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